quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Avesso


Acordei e fui procurar meu cachecol.
A viagem já estava marcada e os meus ajudantes a caminho.
Cinco em ponto.
Quando passaram sobre minha cabeça agarrei-me a eles e depois de algum tempo de viagem respirei fundo e me joguei.
Cai num rio bem pequeno.
Nolu fazia parte do meu roteiro há tempos. Lugar exótico, segundo outros exploradores. Havia poucos arquivos sobre o lugar e isso me instigou ainda mais para as explorações. Essa lacuna eu queria ser o primeiro a preencher. Sai de dentro do rio com os sapatos molhados, apanhei na bolsa lápis, papel e gravador. Mal dei os primeiros passos logo cheguei a uma pequena casa, nada convencional. Não era muito parecida com nossas habitações. O senhor que lá encontrei vivia suspenso numa casa que mais parecia uma crisálida. Não questionei, já havia me acostumado às novidades. Desde que me tornei um explorador me surpreender e ficar calado, observando, era minha especialidade. Ao me ver, ele desceu por uma espécie de teia e veio logo me interrogando. Expliquei que meu objetivo ali era apenas conhecer e catalogar o lugar. Ele ficou curioso sobre outras civilizações e me convidou para um chá. Explicava-me que ele próprio plantava e colhia, buscava água e fazia o fogo. Perguntei se todos os Nuluandos dominavam o fogo, pois era obtido de uma forma bastante curiosa. O senhor me mostrou duas esferas prateadas que ao se chocarem produziam faíscas que permaneciam acesas como um pequeno fogaréu até serem separadas novamente. Era assim que ele cozinhava. Pareceu-me óbvio que lá não haveria nenhuma espécie de combustível fóssil, ou algum outro artefato inflamável a não ser as tais esferas pratas as quais ele chamava de Dádiva. Não poderiam ter outro nome, pois se não fosse elas o que proporcionaria o fogo tão elementar para sua sobrevivência? Em minhas outras viagens conheci alguns lugares que haviam superado essa necessidade do fogo, mas em Nolu as Dádivas ainda faziam toda a diferença. Aceitei o chá e comi algo parecido com nossa maça. Perguntei sobre os demais moradores e a resposta se mostrou triste e cheia de mistérios. O homem me explicou que os outros moradores eram carrancudos, maus, egoístas e pretensiosos. Contou-me que quando ia pegar água, às vezes demorava cerca de quatro horas. Eu não entendi, já que havia percorrido a distância entre o rio e sua casa em poucos segundos. Resolvi não questionar e ouvir suas historias. O morador não utilizava a água do rio em que cai para o uso doméstico, aquele riozinho fornecia apenas água de beber. Então para ter água em sua casa tinha que ir ao outro extremo do lugar, porém era tão pequeno que continuei cheio de perguntas. Ele me explicou que andava bastante e demorava tanto porque sempre tinha que desviar das outras pessoas. Não gostava delas. Disse-me que agiam esquisito e tinham umas caras de dar medo. Ora eram agressivas ora eram hipócritas, além de tudo cochichavam quando o viam. Definitivamente não as tolerava e preferia evitá-las. Algumas vezes, me confessou, voltava para casa sem a água necessária de tão desgastante que era ter que ver todas aquelas pessoas. Por isso achava que eu não tinha muito que ver por lá. Nolu até então para mim se resumia a esses dois rios bem pequenos, aos cultivos de poucas frutas que o senhor mantinha e a sua casa.
Eu estava disposto a explorar, a conhecer esses tais carrancudos e quem sabe entendê-los. Minha curiosidade, assim como a de todos que passavam por Nolu e não entravam era principalmente do porquê o pequeno planeta brilhar tanto de longe. Eram tantas as luzes lá de cima que eu precisava saber o que era. Alguns estudos anteriores comprovaram que a luz era mais forte no horário da incidência dos raios de sol sobre o planeta. Pensei na possibilidade de Dádivas gigantes em algum lugar do planetinha, que ao se tocarem faiscavam e refletiam para todo o Universo. Agradeci a gentileza e fui à exploração, depois de alguns metros percorridos, percebi que não havia mais nada para ver. Não falei com nenhum morador, não haviam dádivas gigantes e eu não tinha mais nada o que fazer ali. Pedi aos meus ajudantes que viessem me buscar e lamentei por meu mais novo amigo. Nolu tinha apenas um morador. Todo o mistério se resumia aos vários espelhos espalhados por toda a parte.

3 comentários:

Thereza Cristina Santos disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Thereza Cristina Santos disse...

Todos somos, um pouco ou muito, moradores de Nolu...
=D

Lella Cristina. disse...

muito bom mesmo.
mas acho q Nolu tem mais moradores do que pensamos...rsrs